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O prefeito eleito João Dória e seu novo secretário de cultura, André Sturm, resolveram mudar a forma da Virada Cultural para o ano de 2017. Segundo o novo prefeito o “lixo vivo” terá uma virada concentrada em Interlagos, com ônibus saindo da Praça da Sé, Vale do Anhangabaú, Largo do Arouche e “mais outros dois pontos”.

A frase sobre “lixo vivo” veio acompanhada de uma descrição bastante singular a respeito do Funk: “Os pancadões são um cancro, financiados pelo PCC. Estou afirmando isso, é um fato real”. Real é uma palavra um pouco subjetiva nesse caso. Em uma série de reportagens, o portal G1 destaca:

 



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O funk, segundo uma pesquisa do DataPopular, representa:

capturar

E por que cargas d’água você está falando do Funk? A matéria não era sobre a Virada Cultural ?

Calma, quiridus. A gente chega lá.

Voltemos então {{antes que a curiosidade mate a leitora-gata e/ou o leitor gato}} à virada cultural:

https://youtu.be/J4P6pi6k11Q

Depois disso o secretário de cultura afirmou:

“Quero vê-los com programação frequente, nos moldes do que fiz no MIS. Em bairros distantes, espaços públicos adequados e seguros para receber a população frequentemente”, afirma Sturm.

E aí a confusão é proposital. A Virada Cultural é um evento. Aparatos culturais funcionando nos bairros de forma constante não é evento, é {{ou deveria ser}} política cultural. E é aí que entra a desconfiança. A cultura, no caso, é a do Teatro Municipal e MIS ou a dos “pancadões do PCC”, como considera o prefeito? Quem terá direito a cultura e qual cultura será disponibilizada à população?

Este blog foi conferir a virada cultural em Parelheiros este ano {{Confira o post “A Virada na Quebrada}}. E ouviu de diversos moradores da região a mesma coisa: moradores não frequentavam a Virada Cultural há muitos anos por conta da distância com o centro.

Colocar ônibus saindo da região central para Interlagos pressupõe que as pessoas já estejam na região central e não deveria ser necessário explicar por que demônios a premissa está errada.Mas como a vida, às vezes, é complicada, a gente explica: apenas na zona leste de São Paulo moram mais de 3 milhões de habitantes.

Considere alguém que more no Carrão e demore, com tudo funcionando perfeitamente, 40 minutos para chegar até o centro da cidade. Levará mais 1 ou 2 horas para chegar até Interlagos onde a “nova” Virada Cultural acontecerá. Não entremos no mérito da questão da venda de Interlagos e como a virada poderá servir de publicidade a esta venda, porque é pedir muito.

O principal custo da Virada Cultural é o da estrutura. É esta a razão pela qual as prefeituras evitam descentralizar os shows, espalhá-los pela cidade é caro. Colocar “shows menores nos bairros” é dar a devida importância aos bairros. Então alguém de periferia terá direito a um “show menor” seja lá o que isso signifique.

Na prática o que fica claro é a política cultural proposta: show grande para bolsos grandes, shows pequenos para bolsos pequenos.

Diminuir a quantidade de pessoas no centro não tornarão o centro mais seguro, ao contrário. Parece uma preparação para manchetes que no futuro servirão de justificativa para encerrar outros shows que não “em Interlagos” ou no bolsão que se resolva fazer, caso mudem de ideia mais uma vez.

Virada Cultural 2017

{{Crianças brincam na ‘Viradinha Cultural’, em Parelheiros – Foto: Victor Amatucci / ImprenÇa }}

 

Não é só show

Outro aspecto absolutamente negligenciado pelas falas do prefeito e novo secretário é o aspecto cultural para além das atrações musicais. É o aspecto da mistura de classes e cores, a revitalização do pensamento de apropriação do espaço público, enfim, a apropriação da cidade pelos munícipes. Aspecto, diga-se, que vai no sentido oposto da gana privatista da nova gestão.

Abrir palcos pontuais na periferia para quem não pode pagar pelo transporte público ou pelos custos de alimentação no centro resolvem uma parte importante da inserção cultural. A concentração no centro da cidade envolve diversos públicos com uma parte importante e histórica da cidade, há muitos anos negligenciada por diversas {{ou todas?}} gestões.

Empurrar a virada para um local único implica em impor os custos de alimentação nesse único local. Agregue a isso o fato de um Interlagos privatizado e teremos, provavelmente, barracas oficiais vendendo comida e bebida. Quanto custa uma garrafa de água em um show privado? O show, por sinal, cobra entrada, não precisa lucrar só com os periféricos {{comida, bebida, camisetas, etc.}}; não será o caso da Virada Cultural num local privatizado.

As vantagens de se promover uma Virada Cultural em um único ponto da cidade é, basicamente, a redução dos custos. Hoje o maior custo da Virada é estrutural {{palco, equipamento, etc.}}. Colocando ela em um único ponto você consegue economizar. O dinheiro economizado poderia ser investido em aparatos culturais durante o ano todo, como disse André Sturm.

Mas é improvável que os aparatos culturais periféricos {{sobretudo as salas de cinema dos CEUs, mas não apenas}} sejam de fato valorizados. Especialmente levando em conta o que disse Dória sobre o funk paulistano, o mais provável é que o dinheiro seja gasto com cachês de artistas internacionais, dando maior publicidade a uma Virada Cultural que será, inevitavelmente, mais branca e de mais alta renda que as ocorridas nas últimas décadas.

Para quem considera a cidade um “lixo vivo”, higienizar parece mesmo o caminho correto. Este blog, humildemente, discorda.

 

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