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O carnaval está de volta a São Paulo. Legalizado, organizado e pluralizado, há tempos não se via tamanha ocupação das vias públicas no carnaval paulistano.

 

Pouca gente sabe, especialmente em tempos de informações a jato, mas São Paulo já foi terra de carnaval.  E o estranhamento {{bom}} causado hoje pela força do carnaval dos blocos de rua da cidade de São Paulo é maior que o causado à época de sua proibição, na gestão Kassab.

A década de 40, em São Paulo, por mais bizarra que pareça a informação, era muito semelhante ao que vivemos no carnaval da gestão Haddad atual, isto é, uma época onde os blocos de rua e bailinhos começaram a se intensificar e se afirmar na cidade.

Já antes disso, na década de 30 o carnaval começava a ganhar força, como mostra essa edição do Correio da Manhã, do domingo, 2 de março de 1930:



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Carnaval em São Paulo

Mas as décadas passaram e São Paulo encarnou o símbolo da arrogância e da pequenez, dando cada vez menos espaço para o que este blog gosta de chamar “Carnaval do Bandeira”, ou simplesmente, carnaval à la brasilis {{para dar um toque de seriedade, invente um latim qualquer, lição aprendida com o nosso estimado Vice-Decorativo}}. Você que já esqueceu das aulinhas de português do colégio, relembra agora:

Uns tomam éter, outros cocaíne.
Eu tomo alegria!
Eis aí por que vim assistir a este baile de terça-feira gorda
(…)
A filha do usineiro de Campos
Olha com repugnância
Para a crioula imoral.
No entanto o que faz a indecência da outra
É dengue nos olhos maravilhosos da moça.
E aquele cair de ombros…
Mas ela não sabe…
Tão brasil!

Manuel Bandeira define muito bem a mistura de classes que se viu nas ruas deste Carnaval 2016. E esta é a verdadeira essência do carnaval. O pobre convivendo em igualdade de condições com os ricos, nem que seja só na bebedeira, nem que seja só na Cachaça Mecânica do Erasmo…

{{ Bloco Cacique do Jaraguá - Vila Madalena - Foto: Gustavo Oliveira - Democratize}}

{{ Bloco Cacique do Jaraguá – Vila Madalena – Foto: Gustavo Oliveira – Democratize}}

Na verdade o Carnaval por aqui começou logo uma semana antes! O bloco Soviético já fazia a alegria da galera um final de semana antes da abertura oficial dos trabalhos carnavalescos. E tantos outros fizeram o chamado “esquenta”, uma coisa absolutamente impensável nos tempos de Serra e Kassab {{e até nos tempos de Marta, pra falar a verdade…}}.

As interpretações sobre essa súbita {{será tão súbita assim?}} vontade de ocupar os espaços públicos são muitas. Que variam desde a repressão à esta prática, por anos e anos a fio; até ao que se convencionou chamar as Jornadas de Junho. Tanto faz.

Fato é que é do prefeito paulistano o mérito de introduzir esse espírito – recente ou não – às políticas públicas municipais. É um espírito público que vai sendo introduzido à fórceps {{~~latim~~, meus queridos, credibilidade é tudo!}} goela abaixo da aristocracia paulistana, por meio de faixas de ônibus, reduções de velocidade e ciclofaixas.  E, claro, a regulamentação do carnaval de rua.

Fosse pouco o aspecto cultural {{não é pouco}}, o financeiro também traz mais retorno do que o excludente e pasteurizado “carnaval de avenida” {{não acredite em mim – Veja São Paulo || assim ninguém me acusa de colocar só fontes favoráveis ao prefeito}}. E não me levem a mal, eu adoro as escolas de samba e sei de sua importância. Mas ela deve ser uma das opções, não a única, como era há muitas décadas na cidade de São Paulo.

{{Foto: Rodrigo Zaim - R.U.A Foto Coletivo}}

{{Bloco MinhoQueens, na Santa Cecília, Centro de São Paulo – Foto: Rodrigo Zaim – R.U.A Foto Coletivo}}

E a parte cultural, quanta riqueza! Desde os blocos mais tradicionais, aos mais étnicos {{nome que os brancos usamos para falar de culturas afro, e achar que estamos sendo politicamente corretos}}, passando pelos populares e até os de rock!

Uma mistura de David Bowie, Punk, Caetano Veloso, passando por Molejão e as tradicionais marchinhas!

E claro, não podia faltar o toque do nosso querido governador-espião e sua tropa da PM, que atacaram um fotógrafo e jogaram bombas em um bloco na Vila Madalena… O relato do fotógrafo, cujo nome permanecerá anônimo, chegou por e-mail:

Isso aconteceu de sexta pra sábado do dia 29/01 pro dia 30/01 na Rua Wisard com a Moraes, na Vila Madalena.

Estava rolando um baile…primeiro os PMs tentaram dispersar com spray de pimenta, mas ninguém se mexeu. Aí formaram a linha e vieram descendo a rua Wisard até chegarem na Moraes… Perseguição a menores de idade, abuso de poder, pegaram uns adolescentes embaixo de uma arvore espancaram.

Então alguém do público jogou uma garrafa e a PM revidou com bombas.  No espaço de menos de um minuto jogaram mais de 15 bombas.

Eu fotografei, mas a PM me prendeu, quebrou meu cartão de memória e me levou para o distrito. Lá o delegado de plantão me aconselhou a não fazer Boletim de Ocorrência porque eu ia ficar marcado.

Não foi o único relato. Na mesma Vila Madalena, uma foliã, cujo nome também permanecerá anônimo, contou que só não apanhou da PM pela bondade dos donos do bar Ó do Borogodó {{famoso boteco de samba em São Paulo}}, que a colocaram para dentro antes que a PM a alcançasse.

Nos demais dias, outros fotógrafos relataram que a PM atuou com menos truculência, ainda que de forma ostensiva, como mostra a foto abaixo:

Mas, ao que parece, foi fato isolado. A verdade é que o carnaval foi recheado por idosos e crianças; foliãs e foliões; e curiosos, que das janelas eram incentivados a descer. Gritos de “desce, vovó”, foram ouvidos em diversos blocos. Algumas sorriam, outras desciam e iam para a festança.

{{Fotos: Victor Amatucci - ImprenÇa}}

{{Fotos: Victor Amatucci – ImprenÇa}}

São Paulo não é Recife. Não é Rio de Janeiro. Não é Olinda, nem Salvador. Mas São Paulo tem histórico de samba e Carnaval.

Esteve esquecido, enterrado sob o túmulo de tantas gestões que preferiam o conforto de meia dúzia à chance desta meia dúzia relembrar o que é cultura.

São Paulo não mudou. Voltou a ser o que já foi um dia. Não somos Olinda e nem queremos ser.

Viva o carnaval sem abadás e sem camarotes. Viva a rua e as pessoas. Vivam as pessoas na rua.

E viva, viva, mil vivas, às ocupações das vias públicas.

Já tomamos tristeza. Hoje só alegria.

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