Os valores propostos pelo governo Bolsonaro para 2020 são apenas simbólicos — se aprovado dessa forma, o orçamento aniquilará a capacidade do CNPq de fomentar a pesquisa científica no Brasil
*Por Herton Escobar
O orçamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) destinado ao financiamento de atividades de pesquisa deve sofrer um corte de 87% em 2020, segundo a proposta de orçamento elaborada pelo governo federal e enviada ao Congresso na última sexta-feira, 30 de agosto. O valor previsto para atividades de “fomento” no orçamento da agência é de apenas R$ 16,5 milhões, contra os R$ 127 milhões neste ano — já considerado um valor largamente insuficiente para a manutenção das atividades mínimas de pesquisa científica no País.
Para se ter uma ideia, em anos anteriores, só a Chamada Universal do CNPq — um dos editais mais tradicionais e importantes da ciência brasileira — costumava distribuir R$ 200 milhões anualmente para centenas de projetos. E esse era apenas um dos muitos editais lançados pelo CNPq e outras agências de fomento para irrigar a produção de ciência e tecnologia em milhares de laboratórios em todo o País; vários dos quais já deixaram de ser lançados ou estão sendo pagos com atraso nos últimos anos, por falta de recursos.
Os R$ 16,5 milhões propostos para 2020, portanto, são apenas um valor simbólico — se aprovado dessa forma, o orçamento aniquilará a capacidade do CNPq de fomentar a pesquisa científica no Brasil, restando-lhe apenas a função de conceder bolsas. E, ainda assim, fica a dúvida: se as bolsas são para fazer pesquisa, mas os laboratórios não têm dinheiro para funcionar, onde esses bolsistas vão trabalhar? “Não adianta ter bolsas se os laboratórios estão paralisados”, como bem disse o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ildeu de Castro Moreira, em entrevista ao Jornal da USP na semana passada.
O orçamento proposto para bolsas do CNPq em 2020 é de R$ 962 milhões, o que representa um aumento de 22% em relação ao valor aprovado para este ano; mas continua abaixo do custo total anual da folha de pagamento de bolsas da agência, que é de aproximadamente R$ 1 bilhão. Basta ver que o montante deste ano, de R$ 785 milhões, só foi suficiente para pagar as bolsas até agosto, e o CNPq aguarda agora uma liberação emergencial de R$ 330 milhões para continuar pagando seus 84 mil bolsistas até o fim do ano.
As fatias do orçamento destinadas à cooperação internacional, divulgação científica e à manutenção administrativa do CNPq também deverão sofrer reduções drásticas em 2020 (veja tabela). O valor total do orçamento deve “crescer” pouco mais de 2% — abaixo da inflação prevista para 2019, de 3,65%. (Esse valor refere-se apenas às despesas chamadas discricionárias do órgão, não incluindo as despesas trabalhistas obrigatórias com salários, aposentadorias e benefícios).
O Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) 2020 está disponível aqui. O texto ainda precisa ser negociado e pode sofrer modificações.