Sempre que um ato termina em repressão a mesma ladainha é ouvida: A PM acusa os vândalos, a esquerda acusa a PM de infiltrar pessoas nos atos e os Black Blocs são criminalizados por todos. Mas até onde se pode afirmar que os infiltrados pela PM são responsáveis pelo quebra-quebra?
Os infiltrados
São comumente conhecidos como P2. São agentes da Polícia Militar que reservadamente {{ou em tese deveriam ser reservadamente}} estão nas ruas para investigar alguma coisa. A teoria é essa, um {{ou uma}} policial sem farda que se infiltra em grupos específicos para obter informações mais detalhadas que não seriam possíveis serem conseguidas com a farda.
Até aí, ok, faz parte do trabalho mesmo, investigar, apurar, antes de prender. O problema é que, desde 2013, muitas ações de vandalismo foram vistas por parte desses infiltrados. Diversos vídeos correm nas redes sobre o mesmo tipo.
Existem, portanto, motivos reais para que se desconfie que policiais infiltrados agem para vandalizar manifestações.
Os Black Blocs
Nasceram, em tese, na Alemanha Ocidental, no início da década de 80 {{lembra, muro de Berlim, guerra fria e pans…?}}. Foram grupos de pessoas que se organizaram, veja você, para enfrentar a repressão policial.
Não se trata de um grupo organizado, como os secundaristas ou sindicalistas ou militantes X ou Y. Trata-se de uma tática. Algumas pessoas tapam o rosto, fazem escudos improvisados e, vez em quando, devolvem à polícia a violência recebida.
ImprenÇa já teve contato com vários adeptos da tática. Majoritariamente jovens, de periferia, se intitulam anarquistas. E como tal não reconhecem o monopólio da violência por parte do Estado, agindo, portanto, para devolver na mesma moeda.
As manifestações
Inúmeras manifestações em todo o país já terminaram com violência policial. Algumas mais marcantes que outras, mas com ou sem black bloc, ninguém pode garantir que ir às ruas no Brasil, atualmente, seja algo livre de balas de borracha ou bombas de gás lacrimogênio vencido.
O comum é o povo de esquerda vir a público reclamar dos infiltrados como se toda violência fosse fruto de gente que se infiltrou para causar vandalismo. Mas, prestando atenção em alguns fatos, vê-se que a narrativa não se sustenta.
Em 4 de setembro de 2016, uma manifestação enorme terminava no Largo da Batata em São Paulo. Durante todo o ato os organizadores, dentre os quais Guilherme Boulos, falavam para que, em caso de alguma violência, os manifestantes sentassem ao chão, para deixar claro quem é que estava agindo desta forma.
Ainda durante o trajeto alguns jovens foram expulsos pela organização por estarem “com os rostos tapados”. A manifestação, absolutamente pacífica e sem mascarados, chegou ao metrô Faria Lima quando as bombas da Polícia Militar começaram a ser lançadas em direção ao público. Algumas imagens podem ser vistas neste artigo da Agência Democratize.
Outra situação foi a manifestação organizada pelos Black Blocs, A manifestação que reuniu cerca de 10 mil pessoas foi absolutamente pacífica do começo ao fim. A ausência de violência se viu em conjunto com a ausência da tropa de choque. Os manifestantes pediam Fora Temer e atravessaram o centro de São Paulo, foram até a avenida Paulista e voltaram ao centro sem serem perturbados e sem quebrar absolutamente nada.
Vandalismo
O ImprenÇa publicou, ainda em 2013, um artigo denominado “Sobre Vândalos, Ostrogodos, Visigodos e PM” na qual fazia uma reflexão a respeito daquilo que se costuma chamar de vandalismo. Para não obrigar a senhora leitora e o senhor leitor a clicar e ler outro artigo e coisa e tal {{Time is money, já diziam eles}} vamos reproduzir a reflexão aqui.
Vândalos eram povos bárbaros que tentavam invadir Roma {{é o resumo do resumo, não espere uma aula aqui}}. Troque Roma pela classe média abastarda, cujo exército de proteção se chama, atualmente Polícia Militar. Troque povos bárbaros por população das periferias.
Temos um cenário no qual populações periféricas são tratadas com violência durante todo o tempo de vida. Abordagens policiais sem mais nem porquê. Agressões físicas e verbais por parte da PM, gente sendo chamada de traficante por estar com o dinheiro do aluguel no bolso {{e por isso vira suspeito de tráfico de drogas, afinal, onde se viu negro com mais de 500 reais no bolso, não é mesmo?}}, enfim, toda a sorte de situações degradantes por parte de quem representa o Estado {{democrático? De direito?}}. A representação do Estado na vida dessa população é a violência.
Por que, então, esperar que essa população responda ao mesmo Estado com flores e diálogo? Não faz sentido e, ainda assim, é o que ocorre na maior parte das vezes. Sem a menor dúvida são grupos minoritários que utilizam da tática Black Bloc. Mas não é legítimo?
O que chamam de vandalismo parece ser apenas o resultado de uma simples relação entre cidadãos e o Estado. Não é a toa que a maior parte dos vândalos sejam negros e de periferia. O vandalismo é política de Estado no Brasil.
Resumão pré-vestibular {{tá com pressa de ler o artigo todo? Leia só aqui}}
A violência policial nas manifestações não depende de infiltrados ou de black blocs ou de vandalismos. Ela depende apenas da vontade do comandante da polícia. Há muitos exemplos de ações de quebra-quebra sem a interferência da polícia, bem como de ataques policiais sem a interferência dos black-blocs.
Agentes infiltrados existem e podem sim iniciar o quebra-quebra, mas achar que toda vidraça é fruto disso é ilusão e desconhecimento. Xingar os anarquistas {{eles se intitulam assim, não é o blog quem vai questionar}} e acusá-los de serem PMs não auxilia em luta nenhuma, por direito nenhum.
A maior parte das vidraças que este ImprenÇa presenciou sendo quebradas vieram depois das bombas da PM e não o contrário.
Seguir nesse discurso pseudo-moralista não arregimenta gente nenhuma, para conquista de direito nenhum. Especialmente quando a gente comemora que as votações das reformas de Temer foram paradas devido ao quebra-quebra e ação policial, pega mal reclamar das mesmas ações e dizer que “é tudo fruto de ação de infiltrados“. Alguns de nós podem fazer a relação entre a comemoração e as reclamações e cobrar um pouco mais de coerência.