Quando jovens do 3º ano do Ensino Médio de uma escola particular do Rio Grande do Sul se vestem de gari, jornaleiro, mecânico, empregada doméstica, atendente do Mcdonald’s, entre outras profissões dignas, para uma festa-chacota cujo tema é “Se nada der certo”, vemos, escrachadamente, o abismo nas perspectivas de futuro apresentadas para nossos jovens, de acordo com sua classe social, durante a formação escolar. Mas isto talvez não seja ‘culpa’ destes jovens. Agora, quando a própria diretoria da Instituição Evangélica de Novo Hamburgo (IENH) defende em uma nota publicada por Facebook o tema da festa, dizendo que foi apenas um “mal entendido”… aí meus amigos, nem um intensivão de Paulo Freire salva.
Por isto, já que a própria direção e equipe pedagógica da Instituição Evangélica de Novo Hamburgo (IENH) não admitem a grave falha, segue um recado do blog ImprenÇa aos alunos que foram à festa:
Isto Não Foi Engraçado.
É impossível não pensar em luta de classes, ao ver uma escola velando seu preconceito sob o argumento de que não houve a intenção de discriminar profissões, já que “muitas delas fazem parte do próprio quadro administrativo e são essenciais para o bom funcionamento da Instituição”. {{Você também pode substituir esta frase por “Não tenho preconceito com empregada doméstica, tenho até uma em casa, que não quero registrar, mas trato como da família”}}.
Também é impossível não ver a manutenção de um sistema elitista e excludente de minorias, enquanto a mesma escola estimula que jovens de classe média/alta se vistam de ambulante, cozinheiro e atendente de loja de supermercado como referência ao “lidar melhor com o contexto de não aprovação no vestibular”, visto que é amplamente conhecido que a maioria da população brasileira não tem acesso ao Ensino Superior, formando, assim, um grande exército de fracassados.
De acordo com o Anuário Brasileiro da Educação Básica 2017, é evidente o maior acesso da população de 18 a 24 anos à Educação Superior, assim como o fato de que esse crescimento ocorreu de forma intensa entre os mais pobres e entre pretos e pardos. Mas, mesmo assim, “as desigualdades que caracterizam o sistema permaneceram e, em alguns casos, até aumentaram. Apenas 6,9% da população mais pobre, somente, está matriculada em cursos superiores (de graduação ou pós-graduação)“ {{Não acredite em mim – Todos pela Educação}}
Por isto, queridos alunos {{ da mais pura origem do latim, cuja palavra significa ausente de luz, também traduzido neste caso por “falta de noção” }}– nem mesmo o argumento de não passar no vestibular é uma piada bem humorada.
Maaaaaas, querem uma piada?
Para a festa de formatura da Instituição Evangélica de Novo Hamburgo, ImprenÇa sugere, como patrono da turma, um certo prefeito, cujo marketing elaborado para levá-lo a todo custo à imagem de joão trabalhador já o fantasiou de tantos personagens reais “que não deram certo”, sempre revestindo os tecidos preconceito sob as cores da descontração. {{Não acredite em mim – Buzzfeed}}
Nas fotos do telão durante a festa, podem aparecer imagens como:
Isto sim, turminha, seria uma piada.
Vê como dar certo na vida é uma questão de perspectiva, jovem promissor da escola de Novo Hamburgo? As fantasias “Se nada der certo” são apenas um espelho do conflito de classes que acontece o tempo todo, cujas minorias (que formam a maioria deste país) são colocadas em um papel de invisibilidade social e fracasso, bem diferentes da ideia de integração, respeito à diversidade e busca por igualdade que a diretoria da escola de vocês deveria estar implementando.
Por isto, uma dica ao corpo pedagógico da Instituição Evangélica de Novo Hamburgo (IENH) quanto à “conscientização da importância de pensar alternativas no caso de não sucesso no vestibular e também a lidar melhor com essa fase”, conforme sua própria nota em resposta: Vestir-se de oprimido e mantê-lo preso à Casa Grande do opressor jamais será algo a ser levado de forma bem humorada. E dá-lhe Paulo Freire na causa:
“O opressor só se solidariza com os oprimidos quando o seu gesto deixa de ser um gesto sentimental, de caráter individual, e passa a ser um ato de amor àqueles. Quando, para ele, os oprimidos deixam de ser uma designação abstrata e passam a ser os homens concretos, injustiçados e roubados de si mesmos” {{Pedagogia do Oprimido, página 36}}.