E vamos nós, mais uma vez falar do tal politicamente incorreto. É que algumas pessoas por desvio de caráter de seus progenitores acham que o humor politicamente incorreto nasceu com a palhaçada fascistoide {{no máximo, porque o fascismo tem um mínimo de QI}} dos responsáveis pela alavancada do gênero Stand Up Comedy no Brasil {{sim, é preciso dar a eles esse mérito}}.
Ninguém tem a menor dúvida {{assim espero}} que humor do bem é coisa do diabo {{yeap, fiz uma piada, conforme-se}} e nem mesmo ele ri de piadas bonitinhas. Há, portanto, um desejo quase permanente de um politicamente incorreto quando o assunto é humor.
Certo. Mas isso não é o mesmo que dizer que mulheres feias quando estupradas deviam agradecer. Isso não é piada, é agressão, estupidez.
Aristófanes, dramaturgo {{manja aqueles tiozinhos que escrevem coisas de teatro, então…}} de inúmeras comédias {{das quais conhecemos bem pouquinho}}, viveu entre 447 a. C. e 385 a. C. escreveu entre tantas peças teatrais uma chamada “As nuvens”.
Em “As nuvens” o dramaturgo grego simplesmente trata Sócrates {{o sofista, não o jogador}} como um sujeito digamos… Problemático. Sócrates passa de inteligente a pateta, fazendo conclusões óbvias e ridículas. Não é exatamente politicamente correto escrever uma peça nomeando um sujeito famoso e tirando sarro da cara dele. Mas Aristófanes tinha um propósito: criticar os sofistas. Para isso ele pega um exemplo famoso e o achincalha, atacando não sua honra mas sua posição como letrado {{Nem me venham com pentelhações do tipo ‘ele não escrevia’, é uma expressão, apena}}.
Em “As rãs” o dramaturgo tira um sarro da submissão feminina. Em “Lisístrata” as mulheres fazem greve de sexo para acabar com a guerra de seus maridos.
Mas não precisamos voltar tanto no tempo. Um pouco adiante, em Roma, temos outros tantos exemplos. Plauto pode ser um deles. Plauto escreveu uma comédia chamada “Aululária”. Estamos adiante no tempo, um pouco, entre 194 e 191 a. C. Na “Aululária” o protagonista é um velho herdeiro de um baú cheio de ouro. A cena mais famosa da peça é uma na qual o velho avarento confunde a filha com o baú em uma negociação. E dá maior importância ao baú.
Também não é o melhor exemplo de politicamente correto. A peça foi copiada {{não exatamente, pesquise mímese no Google}} por Moliére e aqui em terras brasilis por nada menos que Ariano Suassuna {{O Santo e a Porca}}. Nenhum deles é fã do politicamente correto. Nenhum deles criticou uma mulher por ela ter dado de mamar em público.
Moliére foi tão politicamente correto que foi enterrado em um cemitério para crianças não batizadas, a mando da igreja. E não consta que ele tenha feito elogios a estupradores.
Andando bastante no tempo temos no Brasil um outro exemplo de politicamente incorreto, na TV Pirata:
Ou então podemos passar ao Mussum:
A diferença é bastante óbvia, mas eu desenho: A TV Pirata e Os Trapalhões estão usando o humor para criticar aspectos da sociedade, no caso o racismo. Que críticas à sociedade está contida na afirmação “comeria ela e o bebê” ? Nenhuma.
E para quem acha que é possível fazer graça pela graça, sem criticar nada, eu apenas concordo. E demonstro com Jim Carrey {{não achei legendado, desculpe}}:
Note que em 1 minuto e 40 segundos Jim Carrey diz que fará a imitação de um sujeito. A plateia faz um sonoro “aaah” como quem diz ‘está pegando pesado’, Jim apenas responde: “ele ia querer que eu fizesse”. Em seguida ele o imita e a plateia ri, animada. Não houve agressão, apenas piada. Não houve críticas a nenhum aspecto da sociedade e é engraçado sem ofender ou ser politicamente correto.
É também o exemplo de Jim Gaffigan, que faz um show de Stand Up tirando sarro da igreja católica e seus seguidores:
A grande questão, já diria Bakhtin, é que ele se coloca na piada além de generalizar o riso com ‘a igreja católica’ ou ‘os católicos’. E quando nomeia alguém é a figura do Papa, também servindo de crítica ao cargo e não a honra.
Goste do que quiser, ria do que achar melhor, mas não me venha com esse papinho de “Politicamento Correto tirou o Rafinha Bastos do ar”, porque pode ser ruim para sua imagem.
Texto bacana, ainda não tenho posição formada sobre o assunto, mas vamos caminhando neste sentido. Só duas coisas:
1 – Sócrates não era sofista. Platão, seu discipulo, travará diversos embates contra os sofistas e a retórica, sempre utilizando a figura de Sócrates.
2 – Moliére parece até ter recebido um tratamento bom, o teatro era bem mal visto na França de sua época. Pelo menos os atores costumavam receber enterros bem menos dignos, não sei ao certo quanto aos autores, mas imagino que não era muito diferente.
Bruno,
Não é possível estabelecer de que Sócrates trata-se a comédia de Aristófanes. De qualquer modo o personagem de “As Nuvens” Sócrates, é sim um exemplo de sofista. Na grécia clássica há registro de pelo menos três Sócrates diferentes, o de Platão é só o mais famoso.
Moliére não recebeu tratamento bom, muito pelo contrário. A dramaturgia francesa da época era extremamente rígida e seguia os padrões aristotélicos {{ver em Poética}} de drama. Moliére justamente subverteu isso e foi perseguido tanto pela igreja quanto pelos ‘artistas’ contemporâneos.
Abços
Não li “As Nuvens”, estou mais habituado aos textos do Platão. Com certeza existem diferenças entre o Sócrates real e o personagem dos diálogos, mas não acho que as diferenças sejam tão gritantes, retratá-lo como o anti-sofista se na verdade era um sofista. Se vc desprezar o conteúdo dos discursos, tanto Sócrates quanto os sofistas são só uns caras falando pela rua, com a diferença de que o Sócrates é menos bem sucedido financeiramente. Parece-me um bom objeto para uma peça de comédia. De qualquer maneira, não vejo por que chamá-lo de sofista, seja por dar maior credibilidade aos textos platônicos, como eu, ou pela imprecisão histórica da questão que vc citou.
Quanto ao Moliére e o teatro francês daquela época, só tive contato com alguns textos do Diderot. Lembro de alguma atriz ter sido enterrada em uma fossa, por isto disse que o tratamento do Moliére foi até bom. Este exemplo era utilizado para ilustrar como eram mal vistos os atores, ao menos na França, sendo que o texto do Diderot tentava melhorar a imagem da arte de atuar. Fiz uma extrapolação para os autores, mas realmente não tenho conhecimento suficiente para discutir a questão.
Vamos lá Bruno, serei mais claro.
1. Não há certezas de que Sócrates de Platão tenha existido.
2. Há, além do Sócrates de Platão {{que é, portanto, um personagem}} ainda outros 2 Sócrates de certeza igualmente duvidável a respeito da sua existência.
3. Em “As Nuvens” o personagem Sócrates é um sofista. Não há discussões sobre isso. É e ponto.
4. O sofista, nomeado Sócrates por Aristófanes, é retratado como um imbecil incapaz de pensar em coisas cotidianas na comédia “As Nuvens”.
Moliére foi bem recebido pelo público não letrado. Pelo público letrado, pela Igreja e pelos membros da Academia Francesa de Arte era desprezado. Algumas de suas peças chegaram inclusive a ser banidas pela igreja e pela monarquia. Tá tudo lá, na biografia dele.
Assumindo que Sócrates não existiu, a peça deixa de criticar um sujeito famoso, perde o sentido a citação que fez de Aristófanes no seu texto, ao menos na maneira como o fez.
No caso do Moliére, em nenhum momento discordei da perseguição sofrida pela igreja. Só não concordei com o enterro dele sendo usado como indício desta perseguição. Parece o mesmo que usar a crucificação de cristo como indício de sua importância, sendo que crucificação era a sentença de morte padrão. Estou sem a bibliografia do Moliére, mas o wikipedia parece concordar comigo:
“Under French law at the time, actors were not allowed to be buried in the sacred ground of a cemetery. However, Molière’s widow, Armande, asked the King if her spouse could be granted a “normal” funeral at night. The King agreed and Molière’s body was buried in the part of the cemetery reserved for unbaptised infants.”
Bruno querido,
Vamos lá acho que você está sendo um pouco precipitado em suas leituras, mas vou de novo:
Existiu ALGUM Sócrates, não necessariamente o de Platão, ficou claro? Não dá para definir QUE Sócrates foi real, embora até pelo número de citações, deva ter existido algum {{ou mais de um, vai saber…}}.
A Wikipédia não é dado confiável, ainda assim você pode ler no mesmo link que achou o parágrafo acima:
“But more serious opposition was brewing, focusing on Molière’s politics and his personal life. A so-called parti des Dévots arose in French high society, who protested against Molière’s excessive “realism” and irreverence, which were causing some embarrassment. These people accused Molière of having married his daughter. The Prince of Conti, once Molière’s friend, joined them. Molière had other enemies, too, among them the Jansenists and some traditional authors. ”
Como ele nasceu fidalgo é claro que encontrou quem lhe desse abrigo, mas sofreu muitas retaliações durante a vida.
Abço
“
Olá, gostei dos exemplos que você colocou. Um dia eu havia pensado nisso: colocar alguns exemplos de piadas, politicamente incorretas ou não, mas que fossem boas, ao lado das pérolas que o Rafinha Bastos fala, só para demonstrar o óbvio. Que esse Rafinha apenas não tem graça. Ele simplesmente agride sem trazer nada em troca.
Sobre aquele vídeo do Jim Carrey, eu dei uma pesquisada e descobri que o cara que ele imita, o Michael Landon, foi um ator famoso que morreu em 1991 de câncer. E, se a data que encontrei sobre aquela apresentação do Jim está correta, ele faz essa imitação em 1991, provavelmente após a morte do ator. É um dado muito interessante, mostra que algo que, a primeira vista pode parecer um desrespeito, imitar trejeitos de um cara que havia falecido há pouco, pode ser engraçado superando o ranço do politicamente correto inútil, mas sem cair na estupidez pela estupidez somente.
Realmente nos tempos atuais inventaram essa dicotomia entre o politicamente correto e incorreto,só que a coisa é bem mais complexa como foi postado aqui,belo texto.
Só p quem nao sabe, a pessoa que o jim carrey imita é o michael landon, ator do bonanza que acho que tinha morrido de cancer mais ou menos na epoca
Ele havia morrido de câncer, como uma leitora acima esclareceu:)