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Ele acordou ainda sem entender o que havia se passado. Olhou para o lado e viu um carro amassado. E respirou aliviado. Ele não tinha carro. O alívio se mostrou fugaz e assim que terminou de abrir os olhos sentiu um calafrio, algo gelado pela espinha.
Olhou no espelho e concluiu que não existia metáforas no momento. Era um escorpião que lhe escalava as costas. Tranquilamente ele tirou o bicho com um pedaço de pau e jogou no mato. Ele estava acostumado. Seu barraco, estava encharcado. As paredes {{ele chamava aqueles papelões que dividiam o mundo e a casa dele, de paredes}} estavam ao chão. A beliche o salvou do frio. A água ia apenas até a metade da distância entre o chão e sua casa.
E teve tempo de olhar no relógio, e descobriu que estava atrasado. E correu, ou melhor, nadou até a casa de seu primo. Ele não gostava mesmo do primo, mas o que é que se podia fazer, ele precisava de roupas para trabalhar. Saiu apressado.
E apressado que estava lembrou de avisar que voltaria para o jantar. E ouviu do primo que só jantaria se trouxesse algo. Que o primo não era sovina, mas que não havia condições de repartir a cesta básica entre 8 pessoas, e que com ele seriam 9. Respondeu que tudo bem, comeria algo na rua.
Correu apressado do primo até o trabalho. E descobriu que havia muita gente esperando por ele. Sentiu-se importante. E foi xingado. Os motoristas resolveram que ele era o culpado. O túnel alagado.
Encontrou com os companheiros de trabalho, todos cansados. E tomou um café quente que esquentou o corpo molhado. E trabalhou horas a fio a pensar que era um absurdo um túnel alagado. E o carro amassado. Comeu também uma bolacha que um companheiro entregou, calado.
E terminou o primeiro turno, estafado.
Doze horas havia se passado. Um café e uma bolacha. Um corpo estafado. E um jantar recusado.
Foi quando viu o companheiro se dizendo cansado. Alegrou o companheiro com uma alegria que ele mesmo não tinha. E voltou para o trabalho. Não se importava com o cansaço, ele precisava de renda extra para, um dia, pagar pelo estrago no carro que fez o seu barraco. Não era de todo culpado, pensou. Mas, afinal,  foi sua casa que fez o carro ficar estragado.
Sentiu-se tonto. Lembrou que precisava jantar. E resolveu que o turno ia terminar. Do lado de fora outros motoristas, cheios de razão, continuavam a culpá-lo. O trânsito parado. A cabeça girando, o estômago doendo, as pernas bambas e ele tentando ir embora. Foi quando tropeçou e caiu.
Olhou para o chão e sentiu-se recompensado. O jantar estava comprado.
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