O que começou {{em São Paulo, pelo menos}} como uma manifestação por melhores condições de transporte coletivo, de uma hora para outra, torna-se uma explosão de manifestações Brasil a dentro. Gente de esquerda dizendo que é lindo. Gente de esquerda dizendo ‘sai coxinha, sai reaça da minha passeata’ {{?!}}. Petistas, como meu amigo Sérgio Telles do RJ, preocupados com a imagem do PT ou com alguma suposta tentativa de golpe. E uma classe média que grita: “O povo acordou”.
Embora eu entenda o significado da expressão “O Povo acordou”, fica complicado engolir tranquilamente esse tipo de expressão. Quem acordou agora, cara-pálida? Os movimentos sociais sempre estiveram acordados, mesmo quando criminalizados pela lei ‘ficha limpa’, que boa parte destes que gritam ‘o povo acordou’ exigiu e comemorou.
O fato é que R$3,20 é mesmo um absurdo. Ponto. Nisso não há discussão.
O que não significa dizer que o prefeito nada fez na área. O bilhete único mensal já tem data definida para começar. Já há licitações para novos corredores de ônibus. E é verdade também que o prefeito segurou o aumento {{que ficou bem abaixo da inflação e ao contrário de um monte de cidade que fez demagogia, subiu em junho. Não fez como tantas que subiram em janeiro para baixar em junho e continuar mais cara que em 2012}}.
Mas, o fato é que isso não muda a situação de ser R$3,20, um absurdo.
Haddad geriu {{e gere}} a crise muito mal. Colocou na secretaria alguém muito ligado aos empresários de ônibus e, segundo o que ouço de lá, é a quem mais dá ouvidos nesta questão.
Neste momento, minha leitura é: Haddad pressiona pela aprovação da lei que traz parte dos impostos da gasolina para o transporte público e só pretende revogar a tarifa depois disso.
A justificativa é nobre e parcialmente verdadeira: não quer diminuir os investimentos em outras áreas. Isso é verdade em parte. A outra parte, é que de 2004 para cá o número de passageiros aumentou 80% nos ônibus. E a frota diminuiu 1,5%. Ou seja, a outra parte nem tão nobre, é a que Tatto esconde: o lucro dos empresários aumentou e está sob risco.
O ImprenÇa não acredita em tarifa zero. Ou melhor dizendo, não acredita em tarifa zero sem criação de imposto. E não compra a ideia de que o imposto iria tarifar só os ricos.
A Erundina, embora diga o contrário, também não acredita. Ela mesma tentou e não conseguiu implantar.
Isso posto, o que a PM fez na última quinta-feira, durante o quarto ato de protesto não tem outro nome senão crime. E como todo crime tem um mandante, o secretário de (in)segurança pública, Grella e seu chefe Alckmin deveriam estar presos. Porque se Haddad paga pela omissão o que fez o PSDB de São Paulo é muito mais grave.
Pessoas foram perseguidas. Bombas atiradas desnecessariamente. Tiros de borracha contra a janela dos prédios. Coisa digna de… melhor nem citar.
Eu estava no RJ durante este ato, mas fui e presenciei o quinto ato. E me pergunto: por que o nosso governador fechou o espaço aéreo?
Enfim, o que eu assisti foi uma multidão saindo do largo da batata, indo até a ponte estaiada, subindo a ponte, descendo a marginal e indo em direção ao Palácio dos Bandeirantes {{porque a tarifa do metrô e cptm, 95% empresa pública}} também aumentou.
O que eu vi? Sim, muita gente de classe média com gritos de ‘eu sou brasileiro com muito orgulho…’ . Um dia, quem sabe, alguém me explica qual a desse grito. Num estádio faz sentido, porque é Brasil contra alguém. Mas nas ruas, havia dúvida de que não éramos todos russos ?
Gritos também de “O povo acordou” que me deixaram um pouco revoltado, lembrando das bombas de gás que levei defendendo a USP tantas vezes, entre outras…
E fico preocupado com isso? Em parte. A preocupação maior é ver colegas de esquerda com ‘a classe média não devia estar na rua, ela não pega ônibus’.
E daí, nego? Eu não sou gay, logo não posso defender causas contra a homofobia? Eu não sou índio então que matem todos? É isso mesmo?! Não, né?!
O que está por trás desta preocupação dos colegas é uma preocupação legítima e genuína: a distorção de uma reivindicação importante se transformar em ‘ato contra a corrupção’. E eu aviso, amigos: por enquanto não corremos esse risco. Se alguém está lá defendendo isso está sendo usado por uma causa bem nobre: a do transporte público de qualidade. E eu acho bom.
Como também não é verdade que não há a classe pobre se manifestando. Hoje as manifestações foram para a periferia. Ficou bem claro isso quando a M ‘ Boi Mirim foi fechada hoje {{não acredite em mim}}. E também ficou bem claro isso na frente do Palácio dos Bandeirantes.
Em minha opinião o que acontece é uma revolta generalizada. Cada um com uma bandeira, mas saindo ao mesmo tempo. São todas legítimas? Não, todo mundo sabe que o PSOL tá afim mesmo é de ocupar o espaço que continua sendo do PT e, por isso, no meio da passeata só grita contra o prefeito.
Todo mundo sabe que o pessoal do PT só grita contra o governador.
Estão ambos errados? Não. E a classe média, taxada de coxinha por muita gente que se diz de esquerda, está lá para ocupar as vias públicas. Numa sede pelo espaço público que nós, da esquerda criamos e mostramos ser possível. Não é disso que se trata o “Existe amor em SP” ? A Matilha Cultural?
Então nós, da esquerda, vamos defender a saída da miséria e entrada na classe média e vamos, em seguida, questionar a participação da classe média no movimento social? Tem lógica isso?
É claro, óbvio, transparente e retilíneo que essa classe média carece de educação política. Mas não acho muito diferente dos grupos radicais que vi na USP durante minha vida acadêmica. Careciam também de educação política. Ou não?
Falta liderança. De verdade. Falta diálogo e, sobretudo, resta muito ranço de uma luta de classes mal esclarecida. E para mim é aí, justamente aí, que está o erro crasso de Haddad: a falta desta leitura faz todo mundo se unir contra a passagem.
Fosse ele mais esperto e estava todo mundo unido contra a passagem…do metrô. Acho que o papel de cidadão, neste momento, é ser didático. Explicar à classe média o que significa reforma política e como se muda isso. Mostrar a bandeira é melhor do que partir do preconceito idiota de que eles simplesmente não vão entender nada.
Para mim, isso tudo é democrático. E é lindo.
E vamos à luta.
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