Desde minha última reportagem para o ImprenÇa, me dei conta de que só falo de protesto, todos eles com 100 no título. Percebi que tenho também essa obsessão por “100”… Relatos de eventos onde estavam uma centena ou 100 mil pessoas são uma marca das minhas colaborações para o site. Refleti sobre isso com o editor Victor Amatucci que muito generosamente disse: “faz parte!”. Porque eu estava incomodada com esse padrão, decidi aproveitar um momento de lazer para buscar para você, leitor do ImprenÇa, algo mais ameno e prazeroso. Pensei umas cem vezes (ops!) e decidi escrever sobre outra coisa que não os temas recorrentes da minha vida: a esquerda e suas pautas de movimentos sociais, protestos, direitos humanos e afins.
Uma vez que sou correspondente na Irlanda, achei razoável usar minha experiência pessoal na Europa e contar um pouco sobre algumas viagens que porventura possa fazer. Já fiz algumas e sei que um amigo do Brasil gosta de meus relatos sobre elas. Não são muitos, os relatos e as viagens, mas ele gosta. Nada poderia ser mais apropriado para o momento do que uma viagem à Paris. A ideia era falar com as pessoas e conhecer um pouco sobre a vida na “cidade das luzes” e dos casais apaixonados. Na minha cabeça, as pessoas em Paris seriam felizes, orgulhosas por estarem vivendo lá e muito apaixonadas. Porque minha experiência em Dublin tem sido muito boa, Paris deveria ser um bom lugar para encontrar gente feliz e satisfeita… Organizei as ideias e parti em busca de um conteúdo bem ‘água com açúcar’ para o ImprenÇa.
Antes da viagem, fiquei bastante ansiosa. No embarque uma neve caiu por alguns minutos em Dublin, o que me fez gelar de medo. Nada muito forte. Passou e seguimos. Alguma turbulência no caminho e desembarque com segurança. Várias famílias irlandesas também viajavam para a Disneylândia de Paris, e estávamos todos (eu e as crianças) muito excitados. O aeroporto ficava longe, muito longe, o que me impediu de ter aquela inesquecível primeira vista aérea da cidade e a primeira vista de Paris veio só em terra firme, quando fiz então a primeira foto da Torre Eiffel, à kilômetros de distância…
O primeiro contato com a cidade aconteceu no Metrô. Sim, o “metrôzão velho” de Paris dos filmes da minha vida toda se materializou na minha frente e me transportou por túneis que não conhecia mas que reconheço desde sempre. Os altos e baixos dos subterrâneos, muita gente indo e vindo, cores, vendedores e muita propaganda. O metrô em Paris (assim como o de Amsterdã) tem dois andares. Muita gente para transportar precisa de mais espaço no trem. A solução? Ampliar para cima. Incrível! Na saída, sigo guiada pelo Google Maps e me perco na cidade…
No balcão de informações do Metrô fui pega pela primeira falha de comunicação de que fui vítima: bilhete de turista. Paris é obviamente uma das cidades que mais recebe turista no mundo e você pode comprar tickets semanais que são bem mais baratos que os unitários de São Paulo, #FicaADica. O gelo da neve insistiu em me acompanhar ainda um pouco mais e me deparei com o segundo emblemático símbolo de Paris: o parisiense. Ele também existe e é bem real, fato que eu sempre relutei em acreditar. O parisiense das ruas é gelado, apressado e não fala inglês. Não quer parar para te ouvir e tentar te entender. Se não fosse por um detalhado mapa com fotos, eu teria dificuldade de chegar ao meu primeiro destino: a Praça da Bastilha.
No segundo dia me joguei na Praça da Bastilha para tentar falar com o maior número de pessoas possível, considerando a barreira da língua e o ritmo acelerado da cidade. Como meu contato acabou sendo mais fácil com os trabalhadores do comércio que falam inglês e não por acaso, não são parisienses (segundo minha reduzida amostragem), a cada oportunidade perguntava sobre o que os fez deixar seus países de origem e escolher essa cidade para viver. Iniciava a conversa com assuntos genéricos: os cafés, a cultura, a beleza da cidade, etc. Após 3 ou 4 perguntas, mesmo que eu me esforçasse muito, acabava caindo nos temas que eu queria evitar, pois a proposta era um texto “leve” para o ImprenÇa…
Estive em Paris na semana em que um atentado atingiu o parlamento britânico deixando 5 mortos e muitos feridos (22 de março). Paris também sofreu uma ameaça de atentado na semana anterior (dia 18 de março). A cidade vive em estado de emergência desde 2015 e o exército está nas ruas, armado com metralhadoras e outros equipamentos bélicos que eu não tenho a menor condição de reconhecer.
Impossível não perguntar sobre a pressão em torno dessa realidade de bombas, morte, fanatismo e etc, A resposta? Isso não os afeta! Não se sentem inseguros e não sentem medo. O exército está nas ruas e os protegem, foi o que disseram. Estar morando em Paris com todos aqueles prédios maravilhosos, o Louvre, a Torre Eiffel, o Metrô, Macarron, etc, etc, etc, vale à pena! “Estamos em Paris! Tudo o mais é bobagem” é o que dizem.
As pessoas com quem tive contato são do setor de comércio e são eles que recebem os turistas. Em todos os lugares por onde passei, um imigrante me atendeu com um sorriso no rosto. Na semana da votação da lei da terceirização pela Câmara dos Deputados, foi impossível evitar essa curiosidade acerca do trabalhador no país. Eles seriam seguros e estariam felizes? Questões desse tipo pipocavam na minha cabeça e me encontrei com um brasileiro jornalista vivendo em Paris com quem conversei por alguns minutos.
O jornalista Paulo Simões vive fora do Brasil há dois anos. Dentre outros assuntos, falamos sobre a precarização do trabalho na Europa pois Paulo tem alguma experiência com ‘sub emprego’ nos lugares onde viveu (Canadá, Londres e Paris). Na França, os contratos podem ser por tempo determinado e por tempo indeterminado, que segundo ele, são os mais difíceis de conseguir. O jornalista esportivo tem dois empregos fora de sua área e consegue usufruir de alguns benefícios do governo francês pois tem cidadania européia. Nossa conversa aconteceu dentro do Boulevard Victor Hugo que ele apresentava para sua mãe. Ela se disse muito decepcionada com as perspectivas de mudança de aposentadoria no Brasil, pois ainda está contribuindo para conseguir um salário mínimo e não sabe se terá mesmo direito a esse benefício.
Meu último dia em Paris foi silencioso. Não me comuniquei com ninguém pois estava cansada de levar bronca de parisiense no balcão de turistas. Por sorte, não me perdi no Metrô. Durante minha primeira passagem por Paris não subi na Torre Eiffel, não passeei no Rio Sena e não entrei no Moulin Rouge. Não comi brioches mas tomei bastante vinho barato embaixo da Torre pois diferentemente da Irlanda, em Paris se bebe nas ruas*. Comi alguns doces como Macarron e Pastel de Belém, e outras delícias bem açucaradas. Não me apaixonei, mas vi a cidade das luzes a noite do alto do Arco do Triunfo.
Me dou o direito de dizer que o ImprenÇa esteve em Paris para reafirmar a certeza de que o Brasil ainda tem muito que evoluir. Paulo tem uma consultora do governo que faz questão de procurar por ele e dizer: “segue por esse caminho e não por aquele, pois esse pode ser melhor e mais seguro”. O Estado parisiense, independentemente de qualquer outra crítica que se possa fazer, está presente na vida do cidadão dando conselhos. Sob o ponto de vista de um cidadão brasileiro, este Estado está atuando para sua proteção, diferente do atual governo brasileiro que está atuando fortemente para aniquilar qualquer segurança que se tenha, propondo reformas que destroem o trabalhador e protegem a empresa. Mas esse aqui é um texto “light” e esse assunto chato de gente de esquerda vai ficar para uma outra oportunidade…
O ponto alto da viagem? Veja o video e eu tenho certeza que você vai concordar!
*Paulo Simões esclareceu que a polícia permite que se beba perto da Torre. Mas beber nas ruas de Paris também é proibido.