Na última terça-feira, 27 de junho de 2017, a Polícia MIlitar de São Paulo invadiu a favela do Moinho e, alegando perseguição ao tráfico de drogas matou um jovem de 18 anos, usuário de drogas. A família denuncia que antes de levar 5 tiros, Leandro foi torturado dentro de um barraco vizinho; segundo os familiares a PM teria usado um martelo para a tortura. Nenhuma droga foi retirada do local.
A PM alegou que a favela do Moinho é um “centro de distribuição de drogas para a cracolândia”. É difícil crer nesta versão como razão da invasão da polícia no local, considerando que ninguém foi preso e um jovem foi morto depois de mantido por cerca de 1 hora em cativeiro num barraco.
O que há em comum entre a favela do Moinho e a cracolândia?
Além das constantes invasões da polícia militar, sempre com a desculpa de combate ao tráfico, as duas regiões são alvos constantes de investidas da especulação imobiliária. A favela do Moinho sofreu com diversos incêndios na gestão Kassab, levando à população local a desconfiar de que os incêndios eram criminosos, já que a favela está em uma região bastante valorizada no centro de São Paulo.
Existem diversos projetos arquitetônicos que buscam construir prédios no local. Alguns deles, inclusive, propõem que a linha férrea que atravessa a comunidade passe a ser subterrânea, o que valorizaria ainda mais os futuros empreendimentos imobiliários na região.
Ao mesmo tempo em que a especulação imobiliária pressiona áreas valorizadas, onde desavisadamente pessoas moram {{atrapalhando negócios lucrativos}}, a Polícia Militar cumpre com seu papel no jogo econômico, sempre com a desculpa da “Guerra às Drogas”.
No entanto, uma reflexão mais aprofundada da questão das drogas deixa dúvida quanto à eficácia desse tipo de ação. Recentemente um helicóptero de um Senador da República caiu com cerca de 500 kg de pasta base de cocaína, em Minas Gerais. Semana passada um avião com outros 500 kg de drogas teria decolado da fazenda de um Ministro de Temer.
A PM já foi acusada de participar do tráfico de drogas na região da cracolândia e, recentemente, foi flagrada em mais um escândalo, agindo como linha auxiliar dos traficantes:
A reportagem acima é datada de 28 de junho de 2017. Fica difícil crer que o jovem baleado e, segundo familiares, torturado pela PM fosse de fundamental importância para o combate ao tráfico na cidade de São Paulo, quando lemos notícias como estas.
Ainda que fosse, a PM deveria apenas prender o cidadão, não torturar e/ou matar quem quer que seja. A mesma justiça que prendeu o batalhão da PM por tráfico, prenderia o jovem morador da favela do Moinho.
Guerra às Drogas
Este blog já fez uma série de artigos a respeito da tal “Guerra às Drogas”, recomendamos principalmente dois artigos:
Não é preciso ser tão “radical” como este blog para entender que a lógica está errada. Quantas ações serão necessárias na cracolândia para que se entenda que o crack não brota no chão da rua Helvetia ou da rua Dino Bueno? Quanta inteligência policial é necessária para o entendimento que por mais traficantes que se prenda no meio de uma favela, a droga não surge como num passe de mágica?
Fica óbvio que a PM tem feito um trabalho preguiçoso, quando o assunto é o combate ao tráfico de drogas. Jovens pobres são quase sempre o alvo das ações de combate às drogas. Mas, ora, se são os donos da droga, por que são pobres? Não é preciso assistir a nenhum especial da Netflix para sacar que as drogas são um negócio bastante lucrativo para quem comanda o negócio.
E parece óbvio que quem comanda o negócio não lida com o fluxo da cracolândia. O bom senso, além dos indícios, mostram que é mais provável que os reais responsáveis pelo abastecimento das drogas no país sejam donos de aviões e helicópteros e não jovens que fazem uso abusivo de substâncias psicotrópicas no meio de favelas.
Se é verdade que os policiais que saem às ruas não são os responsáveis pelo planejamento das ações antitráfico – quase sempre o comando da operação chega depois da ação concluída – também é verdade que são linha auxiliar de um negócio quase tão lucrativo quanto as drogas: a especulação imobiliária.
As grandes construtoras, como se pôde observar nas ações da Lava Jato, estão por trás de quase tudo que é lucrativo no país. Seja na construção de prédios populares com o Minha Casa, Minha Vida; seja na construção de arranha-céus responsáveis por deixar milhares sem um teto para viver.
E o que faz a Polícia? Normalmente chega antes, limpa, literalmente limpa, o local e prepara o terreno para os futuros lucros. É assim na cracolândia, é assim no Moinho e será assim enquanto a população estiver sob a névoa da “guerra às drogas”, uma desculpa sensível a quase toda tragédia nas periferias do país.
Senão “Guerra às drogas”, o quê?
A experiência da Redução de Danos no Brasil tem se mostrado eficiente na diminuição do uso abusivo de drogas. Foi distribuindo seringas aos usuários de drogas injetáveis, nos anos 80 e 90 na cidade de Santos, sob gestão da petista Telma de Souza, que a morte por conta de complicações deste uso diminuiu. Como efeito colateral, ao invés da morte e tortura de jovens, uma importante redução no contágio do vírus HIV, causador da AIDS.
Foi baseado {{pegou o trocadilho, né?}} nesta mesma lógica que a gestão Haddad implementou o programa “De Braços Abertos”, que propunha empregar usuários e dar moradia, sem necessariamente exigir a abstinência deles. O efeito colateral dessa ação? A diminuição do uso do crack na região da Luz em 70%.
É mais complicado explicar para a população a eficácia de um programa de redução de danos, quando tudo que lemos na imprensa nacional e aprendemos na escola é que “drogas matam”. Mas as mesmas pessoas que dizem isso são fumantes, fazem uso de álcool e café, quando também não fazem uso de drogas ilícitas. A incongruência no discurso deixa claro os motivos do insucesso dessa lógica.
E na espreita, como quem não quer nada, a especulação imobiliária faz o seu dinheiro. O custo é quase nada para os engravatados brancos das construtoras, hoje delatores oficiais, curtindo seu dinheiro com uma tornozeleira nas casas compradas com dinheiro público surrupiado: para eles o genocídio da juventude negra e periférica, é apenas custo da obra.
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