Bolsonaro e a nova velha Política
Velhas Práticas, nova roupagem
O novo de Bolsonaro até aqui tem se mostrado o mais velho da prática política brasileira. Amigos sendo indicados em cargos nos quais lhes faltam competância, ministros incompetentes e com acusações de corrupção, além de um discurso populista.
Bolsonaro acumula inúmeras decisões contraditórias, declarações desmentidas e uma série de fatos que condenou, em discurso, sua vida toda. Uma continuidade de algumas práticas como a de dar emprego a familiares e amigos, a vista grossa nas indicações suspeitas de seus corregelionários e uma áurea de que está inaugurando uma nova era no Brasil.
As acusações colocadas pela imprensa em 2018 sobre o uso indevido do WhatsApp não apenas não foram investigadas como ganharam novos capítulos; os principais apoiadores ingressaram também no atual governo, dando mais margem àqueles que preferem não se cegar por um discurso macartista tupiniquim.
Não há, no entanto, nada de novo em empregar filhos e amigos, abusar do poder político para obter vantagem pessoal – como fica claro no caso IBAMA. Nem a Petrobras, alvo primeiro das críticas de Jair Bolsonaro ao PT ficou de fora das indicações pouco técnicas prometidas em campanha.
O futuro, já diria Cazuza, é um museu de grandes novidades.
O discurso da posse
O discurso de posse presidencial é, em geral, marcado por um discurso mais brando e ameno, apaziguador, sobretudo quando o país está com os ânimos acirrados.
Para se ter uma ideia, o discurso de Fernando Collor {{1990}} dizia:
Meu apreço, e meu louvor, a cada um de meus compatriotas, que, por não terem perdido a esperança, o equilíbrio e o espírito cívico, fizeram com que a transição pudesse ocorrer em paz, sem violência, apesar de grandes dificuldades econômicas ao longo do percurso.
{{não acredite em mim – Discurso Collor (PDF)}}
Antes dele, Sarney – primeiro presidente pós ditadura – também fez um discurso com aceno semelhante:
Estou seguro de que, como sociedade nacional integrada que somos, saberemos encontrar, através do respeito mútuo e do diálogo responsável, o grau de consenso necessário à solução dos conflitos de interesses. Na busca desse grande entendimento nacional teremos tanto mais êxito quanto mais judiciosamente utilizarmos os mecanismos amplos, abertos e equânimes que nos proporciona a convivência democrática.
{{não acredite em mim – Discurso Sarney (PDF)}}
Mesmo Dilma Rousseff, em 2014, depois de uma das campanhas mais acirradas de nosso período democrático, fez aceno semelhante:
Faço questão, também, de renovar, nesta Casa, meu compromisso de defesa permanente e obstinada da Constituição, das leis, das liberdades individuais, dos direitos democráticos, da mais ampla liberdade de expressão e dos direitos humanos.
{{não acredite em mim – Discurso Dilma}}
Jair Bolsonaro, por sua vez, preferiu a manutenção de um discurso que parece ter saído de uma espécie de Guerra Fria Brasileira, exaltando uma luta a um socialismo que na vida real nunca existiu no Brasil:
Aproveito este momento solene e convoco cada um dos congressistas para me ajudarem na missão de restaurar e de reerguer nossa pátria, libertando-a, definitivamente, do jugo da corrupção, da criminalidade, da irresponsabilidade econômica e da submissão ideológica.
Mais adiante ele completa:
O Brasil voltará a ser um país livre das amarras ideológicas.
{{não acredite em mim – Discurso de Posse de Bolsonaro}}
O ‘fim da corrupção’
Com uma campanha pautada basicamente sobre a corrupção petista e o ‘risco do Brasil virar uma Venezuela’, Bolsonaro aponta em seu primeiro discurso que quer acabar com a corrupção e livrar o país deste mal.
Para reforçar essa imagem ele nomeia como Ministro da Justiça o juiz Sérgio Moro, responsável por inúmeras prisões na Lava Jato, incluindo a do principal opositor político e ideológico de Bolsonaro, o ex-Presidente Lula.
Moro, é bom lembrar, se recusou a chamar Lula para depor no 1º turno das eleições presidenciais, afirmando que o depoimento seria usado com fins eleitorais. Mas não se conteve ao vazar delações antigas e ainda sem provas que prejudicam a imagem do ex-Presidente, já no 2º turno da mesma campanha eleitoral.
O homem colocado para Ministro da Casa Civil, ou seja, o 2º nome mais importante do governo é um ex-deputado que afirma em vídeo que usou Caixa 2. Mais adiante a polícia encontrou cerca de 370 mil reais em pagamentos a Onyx Lorenzoni com notas fiscais de uma empresa cujas únicas notas emitidas foram essas, usadas pelo atual Ministro da Casa Civil.
Sérgio Moro, o nome anti-corrupção do governo Bolsonaro, se limitou a dizer que Onyx já se desculpou pelo uso de Caixa 2, esquecendo talvez, o que afirmou em palestra nos EUA: “caixa 2 é pior que corrupção”.
E o Queiroz?
O jornal O Estado de São Paulo denunciou ainda em dezembro de 2018, a movimentação de 1,2 milhão de reais de um ex-assessor do filho de Bolsonaro, cujo salário era de 12 mil reais mensais.
Além disso houve depósitos do mesmo funcionário à esposa de Jair Bolsonaro, em valores que ultrapassavam o salário total do motorista e ex-assessor.
O presidente eleito afirmou que os depósitos se referiam a uma dívida que o motorista tinha com ele. O motorista afirmou que a movimentação de mais de 1 milhão se referia à venda de carros. Isso depois de um sumiço de quase 30 dias.
Depois, o sumiço foi explicado por uma cirurgia que Queiroz seria submetido num hospital de luxo em São Paulo, cujas contas foram pagas não se sabe até hoje por quem.
Aliados de Jair Bolsonaro ainda fizeram acusações ao órgão responsável pela investigação, que depois da posse em janeiro de 2019, ficou sob a tutela de Sérgio Moro, que também não se pronunciou sobre as questões todas envolvendo o novo patrão.
Como se fosse pouco, o mesmo ex-‘motorista, assessor e segurança’ de Bolsonaro aparece em vídeo dançando alegremente. O COAF – órgão que investiga as movimentações financeiras de Queiroz – ainda aguarda seu depoimento.
Só ‘quadros técnicos’, anunciou o Presidente eleito
Em seu discurso de posse, Bolsonaro afirmou:
Montamos nossa equipe de forma técnica, sem o tradicional viés político que tornou o Estado ineficiente e corrupto.
O Ministro da Casa Civil, conforme já citado, é criminoso confesso de Caixa 2 e tem 370 mil reais em pagamentos para explicar. Além disso, as ações do novo ministro até aqui não justificam o apelido de ‘quadro técnico’, ou seja, alguém que está em sua posição por saber exatamente como executá-la e ser competente nessa função.
Foi criado o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. Para chefiar foi colocada a advogada Damares Alves, ex-assessora de Magno Malta, que além de ex-senador sob quem pairam diversas acusações de corrupção, é também ex-aliado de Jair Bolsonaro. Deixou de ser ao não ganhar o ministério como prêmio por sua militância na campanha eleitoral.
A nova ministra foi a responsável, em seu discurso de posse, pela frase ‘Meninos vestem azul, meninas vestem rosa’, em um ministério que tem o dever, entre outras coisas, de cuidar dos direitos humanos no país que mais mata gays no planeta.
Antes disso, porém, uma gravação datada de 2013 mostra a ministra lamentando o fato de a igreja evangélica ter perdido espaço ‘quando deixou a Teoria da Evolução entrar nas escolas’.
Já o vice-Presidente, general Mourão, fez melhor. Escolheu seu filho para ser assessor no Banco do Brasil, triplicando o salário dele, outro critério ‘não-técnico’:
Além das indicações nos ministérios e da promoção mal explicada do filho do vice-Presidente, outras indicações têm causado estranheza em quem esperou que os cargos seriam preenchidos de forma técnica e não por indicações políticas, confira o que diz a matéria do Portal Terra:
Fora isso ainda teve indicação de amigo para a Petrobras, uma das práticas mais criticadas pelos apoiadores de Bolsonaro em relação ao PT. Teve indicação de amiga da primeira Dama para cargo em ministério.
Parecer da Advocacia Geral da União obriga IBAMA a ‘desmultar’ Bolsonaro
A superintendência do Ibama no Rio anulou uma multa ambiental de R$ 10 mil que havia sido aplicada em 2012 ao presidente Jair Bolsonaro por pesca irregular em Angra dos Reis, na Costa Verde. A decisão foi tomada em 20 de dezembro, quando ele ainda não havia assumido a Presidência, após um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) sustentar que Bolsonaro não teve direito à ampla defesa no processo.
O caso, é bom lembrar, refere-se à prática de pesca irregular em uma área de controle ambiental. O fiscal pegou Bolsonaro em flagrante, em um bote numa área proibida. Há foto dele no local, bastante divulgada pela imprensa tradicional.
A presidente do IBAMA foi exonerada no início de janeiro, reforçando a ideia de que houve influencia do presidente sobre a própria sentença que o implicava.